“Aqui encontro tudo. Montanha, lago, e vejo até o mar. As pessoas são gentis.” Tenho lá meus questionamentos sobre muitas palavras de líderes religiosos, mas para essa declaração do Papa Bento XVI, não. A declaração refere-se ao local onde foi fincada a casa de verão dos papas, o vilarejo de Castel Gandolfo. Tive tanto o prazer de visitar esse lugar, quanto de observar o elogioso comentário do pontífice eternizado em uma placa na fachada da prefeitura do vilarejo. Não à toa, é neste local de descanso onde Bento XVI decidiu passar a reclusão, enquanto o conclave do Vaticano escolhia o seu sucessor.
Após oito anos sob tantos holofotes de polêmicas, o que incluiu um histórico pedido de demissão ao papado, acredito que Bento XVI tenha encontrado parte de sua paz interior neste lugar (aliás, recomendo muito o filme Dois Papas, pois retrata bem esse momento de transição da Igreja Católica).
Bom, estive em Castel Gandolfo em 2012. É um lugar absolutamente lindo, a 30 quilômetros de Roma (Itália) e, basicamente, ornado pela enorme propriedade da igreja católica, maior do que o próprio Vaticano. Ela é datada de 1596 e divide a paisagem com uma charmosa praça – com direito a fonte no meio e uma igrejinha de canto -, com o Lago de Albano e, bem ao longe, com o lindo Mar Tirreno.
Não é exagero dizer que Castel Gandolfo é um dos lugares mais bonitos do mundo. E a população de cerca de 9 mil habitantes é bem receptiva e calorosa com os visitantes, o que torna o lugar ainda mais leve e agradável.
A sensação de que o tempo não existe é tão forte, que dá para passar horas sentada em uma das cadeiras daquela praça central, saboreando o incrível “gelato” que vendem por lá. Assim como o autêntico sorvete de pistache italiano, o espírito da gente fica divinamente cremoso ao caminhar por aquelas ruas de pedra, fincadas na montanha.
Normalmente, os Papas vão para a casa de veraneio na Páscoa e, quando a temperatura esquenta demais, voltam para o Vaticano. Eles pegam a brisa entre os jardins e as arejadas dependências da casa, que têm um visual rústico, muito diferente das construções onde vivem. A propriedade tem até uma pequena produção agrícola e pastos com vaquinhas. Tudo, obviamente, fechado ao público.
O único evento que acontece muito de vez em quando é o Papa abrir a porta e sair em uma das sacadas para dar a benção. A última aparição de Bento XVI nesse sentido aconteceu para anunciar o seu “arrivederci” aos fiéis, que aguardavam ansiosos na praça, após decorarem as fachadas das casas em sua homenagem.
Embora não tivesse uma sacada para chamar de minha e nem para quem acenar, também fui obrigada a me despedir de muitas coisas daquele vilarejo: da gentileza das pessoas, do sorvete, da paz na praça e da brisa que decora o nosso rosto, estonteado pelo longo horizonte e suas águas.
*Texto publicado originalmente em 2012




