Seguir roteiros turísticos é um grande risco à alienação. Sempre quando posso, pergunto a um habitante local onde gostam de comer, com o que se divertem, qual é o prato preferido e quais são as percepções políticas e econômicas deles. Quando estive em Cancún, moradores me indicaram o centro velho da cidade para me divertir bem longe dos copos de marguerita enfeitados. Segundo ele, a melhor casa de salsa era o Mambo Café.
Luzes piscantes em azul e vermelho. Uma pista de dança no alto, como se fosse um palco. Mesas ao redor. Casais, amigas em despedida de solteira e amantes de salsa. Todos se aconchegavam entre uma marguerita e uma dose de tequila até a música começar. O ritmo contagiante invadiu o Mambo Café com os primeiros acordes dos músicos afinados. Enquanto isso, as doses da aguardente de agave me davam coragem para “bailar”.
Respirei fundo, tomei coragem e subi ao palco naquele gingado de quem nem samba tanto assim. Lembrei-me das aulas de um venezuelano que conheci em São Paulo, em uma casa de salsa da moda nos anos 2000. Entre um passo e outro ele dizia: “menina, os ombros têm de ser firmes na salsa. Mexer o corpo todo é samba.” Mesmo fiscalizando os meus ombros animados, diverti-me como nunca entre mexicanos, venezuelanos e colombianos.
No dia seguinte, peguei um voo para a Cidade do México. Faminta, de ressaca e sem a mala – extraviada para São Paulo -, cheguei ao hotel no bairro Zona Rosa totalmente transtornada. Passava da meia-noite. Nenhum restaurante ou bar estava aberto e a única informação que eu tinha após brigar horas com a companhia aérea era a de que a capital mexicana é perigosa.
Com o maior mau humor do mundo, conheci José (leia em espanhol, por favor), o taxista do aeroporto. Ele passou os 30 minutos da corrida me convencendo de que aquele bairro era o único seguro da cidade, por concentrar os consulados. Deu a dica de descer a rua até encontrar uma tenda de quesadillas, uma das melhores da cidade, segundo ele.
Acreditei. Sozinha, na noite mexicana, desci a tal da rua. Passei por bêbados, moleques suspeitos, mais bêbados, até que achei uma casinha bem feia e detonada, de paredes cinzas, iluminadas por uma luz amarela, com uma portinha pequena escancarada. Na calçada, mesas de metal vermelhas convidavam quem passava a se sentar naquela noite quente.
Uma senhora atendia e fazia as quesadillas, auxiliada por uma outra mulher. Elas riam, falavam alto, brincavam com os conhecidos. A comidinha de rua virou uma das experiências gastronômicas mais interessantes que já vivi. Tinham várias opções de sabores, mas comi as clássicas, de queijo e de carne com queijo. Refrigerante, era de garrafinha. Para fechar a noite, molho de pimenta bem do jeito que mexicano gosta.
Na primeira mordida, o humor mudou. Eu estava no paraíso. Voltei a sorrir e a esquecer de que, na volta ao hotel, teria de lavar minha roupa na pia e secar com secador. Ao menos, a companhia aérea forneceu um trocado para comprar escova de dente, pasta e desodorante.
E foi com a roupa amassada e um pouco úmida que cheguei antes do amanhecer- naquela mesma madrugada – às pirâmides do Sol e da Lua, um complexo asteca na região da Cidade do México. Outra dica de Jose, que me aguardava em frente ao hotel. Segundo ele, a magia do sol nascendo e da lua sendo gentilmente ocultada no céu pela claridade do dia fazia você entender o poder dos povos pré-colombianos e mergulhar de certa forma na magia espiritual deles. Mais uma vez, Jose estava certíssimo!
*Texto publicado originalmente em 2011









